Esta sexta-feira, final de tarde, peguei um táxi. O taxista era um gordinho que usava uma camiseta escrita "Canabis" atrás, assim mesmo, com erro de grafia. Eu geralmente evito conversar coisas do tipo "tá quante né?" com taxistas então preferi ficar quieta. Parada nesse trânsito gostoso de Sampa, um grupo de rapazes passava a pé próximo ao táxi, conversando animadamente. Depois que o táxi voltou a andar, o gordinho comentou:
- Pobre é foda né?
- Porquê? - perguntei estranhando o comentário.
- Ah meu, cê viu os malandros ali conversando? Os caras tavam dizendo que iam viver de processo, só de processar os patrões, coisa de vagabundo pobre.
- Ah mas isso não é coisa de pobre não, conheço muita gente que não é pobre e vive de processo - respondi.
- Isso coisa de nego que não quer trabalhar.
Aí, andamos mais alguns metros e paramos em frente a uma concessionária de motos. Olhei e comentei:
- Caramba, que moto feia.
O taxista olhou e falou:
-É, essa é feia mesmo. Eu quase comprei uma dessa marca, tu gosta de moto?
- Gosto mas não sei dirigir.
- Eu tenho 3 motos e quero comprar mais uma.
Fiquei quieta pensando "esse cara adora contar uma vantagem".
A conversa continuou, falamos sobre a vida, sobre o trabalho dele. Acabei descobrindo que ele era dono sozinho de 5 táxis, frota própria espalhada na cidade.
O sujeito além de dono de frota de táxi era, pasme, MC do famoso grupo de rap Racionais MC's. Pelo caminho disse que estava programando uns shows que aconteceriam à tarde, durante a semana.
- Pra estudantes? - perguntei.
- Nada, pra bandido mesmo, vagabundo que não trabalha, esse é nosso público. - disse ele rindo.
Por mais meia hora que circulamos ele contou como fazia grana com seus táxis e que de vez em quando faz um troco vendendo bebidas nos shows.
O sujeito, mesmo com toda a carga "cultura de periferia", principalmente cantando em um grupo de Rap, sabia que trabalhar é o que gratifica. Em nenhum momento ele se fez de coitado culpando a burguesia. Muito pelo contrário, ele gostava de contar até uma certa vantagem em possuir seus bens materiais. Fiquei imaginando como será que ele se via. De fora será que ele se acharia um "das elite"?
Claramente, vagabundo e bandido ele não era. Mas como se comunicar e cantar para pessoas que ostentam essa cultura da bandidagem?
27 de out. de 2008
Tamo tudo envorvido
Escrito por Sarah às 15:04
Labels: vida urbana