12 de out. de 2007

O equívoco dos equivocados

O engraçado de se escrever um texto afirmando que as pessoas podem ser donas do próprio nariz parece ofender quem tem idéias esquerdistas (quem sabe, afiliados do PSOL).

O primeiro clichê que aparece é dizerem que eu sou patricinha alienada, jogando ofensas no ar. Vamos lá. Eu fiz faculdade de jornalismo (o antro dos professores "revolucionários" de esquerda) , e até o segundo ano de faculdade eu era igual a muita gente que comentou no post passado. Pensava exatamente da mesma forma. Odiava o Bush, os EUA, achava que a culpa era toda das "elites". Achava que pessoas que nasciam sem dinheiro eram tratadas como lixo pelos ricos, pelo governo. Meus pais foram hippies, participaram da tal "revolução" de 68. Minha mãe teve que queimar seus quadros (ela é artista) para não ser presa pelo DOPS. Veja bem, os políticos "de boa" índole adoram dizer que fizeram parte de revolução de 68, não? Minha mãe era fanzona do Zé Dirceu na década de 60. Ele era bonito e falava sobre a vitória dos jovens, sobre Che, sobre Fidel e sobre Marx, com grandilouquência.

Tínhamos um quadro do Che Guevara em casa e logo ao lado, um enorme da Greta Garbo. Mamãe é fã de Greta e de Che, vejam só vocês.

O que eu tento explicar e as pessoas não entendem é que eu acredito profundamente na liberdade e na capacidade humana. Não estou rebaixando uma classe social, o que eu faço é exatamente o contrário: eu me nego a aceitar que todos estão condenados a uma condição. Me nego a acreditar que exista uma conspiração "dos ricos" para manter os pobres, pobres. Isso não existe. Não existe uma conspiração da Globo, não existe conspiração da revista Veja. Ninguém está conspirando contra a liberdade. Quem conspira contra a liberdade são pessoas que acreditam que um homem que nasce pobre é manipulado, analfabeto, burro e ignorante.

Durante quase 20 anos tivemos uma empregada doméstica chamada Luíza. Ela era analfabeta, tinha trabalhado na roça até os 25 anos. Assim que a fazenda faliu, Luíza veio para a cidade ser empregada doméstica. Largou o marido porque ele "não gostava de trabalhar". Com um filho pequeno uma mãe idosa para cuidar, Luíza precisava de dinheiro. Então trabalhava como faxineira de madrugada, em uma loja, e durante o dia, em restaurantes como cozinheira e depois como empregada doméstica em residências. Quando ela chegou pra trabalhar na minha casa ela tinha quase cinquenta anos. Seu filho estudava contabilidade e já estava trabalhando. Ela era rígida e correta. Talvez uma das pessoas mais honestas que eu já conheci na vida. Luíza, apenas como empregada doméstica, comprou duas casas próprias. Ela alugava uma das casas e morava na outra. Luíza nunca leu um livro. Luíza não assistia TV porque achava "sem graça". Ela ouvia rádio. Cuidava das vizinhas, levava comida para as que não tinham nada. Ajudava os doentes. Comprava remédios, doces para as crianças no dia das crianças. Reclamava da vizinhança, violenta. Dizia que as pessoas tinham é preguiça de por a mão na massa. Que era fácil ficar em casa recebendo cesta básica do governo e assistindo TV. Eu nunca tive dó da Lú, como eu a chamava, porque ela era forte e inteligente, mesmo sendo analfabeta. Ela entrou em um curso gratuito de alfabetização e eu a ajudava a estudar todo fim de tarde. Hoje a Lú vive em sua casa própria, já aposentada. Seu filho é gerente de uma grande empresa e já lhe deu dois netinhos. Luíza me ensinou que integridade é algo inerente.

Não importa de onde se vem, e sim para onde se vai.

Enquanto eu escrevo isso, lembro dos comentários do último post, dizendo que eu falo coisas "escrotas" e sou seguidora de Diogo Mainardi. Quem diz isso não entende as experiências que tive na vida, muitas, que me fazem pensar como penso hoje. Que fui criada e redoma de vidro, que tudo foi muito fácil para mim. As pessoas não me conhecem e tentam fazer ofensas pessoais baseadas em coisas que não entendem. O que proponho é uma discussão civilizada sobre a liberdade humana.

Palavra tão mal utilizada hoje em dia.