5 de fev. de 2007

Norma, a macumbeira

Eu não tenho programação a cabo, portanto capto com uma anteninha em cima do televisor os mais diversos canais, onde 80% deles são evangélicos e os outros 17% são de vendas. Os outros 3% São a Globo, a Record e o SBT.

Tenho também o vício estranho de assistir canais evangélicos. Talvez como uma tortura, mas eu prefiro chamar isso de "pesquisa de campo". Além disso, não duvide, é possível dar grandes risadas de toda pataquada "em nome de Jesus, você poderia me entregar seu dinheiro?". E as simulações, os discursos, os testemunhos, as entrevistas, as cantorias... É uma infinidade de cenas ridículas que, por Deus (olha o trocadilho), são fantásticas!

Minhas favoritas são as simulações de "casos reais" da Universal. São episódios de 5 minutos encenados por pessoas que poderiam ser qualquer coisa na vida, menos atores. Os cenários são improvisados, e uma mesma sala se transforma em quarto, escritório e terreiro de macumba. A linha é sempre a igual: Tudo está bem com a família, mas de repente alguém fica com um encosto e a doença, vira prostituta, traficante, as dores de cabeça e visões de vultos começam a aparecer. Todo mundo está com encosto. É a mandinga, a macumba, o feitiço meu bein. Tu tá amarrado!

Pois lá estava eu, entretida com os encostos, quando aparece a figura mítica: a macumbeira. Sim, a mesma macumbeira fez feitiço em 2 episódios seguidos! Vamos aos roteiros deles:

Episódio 1: Ela fode com meu marido e eu é que fico doente

Lá está o casal. Uma criança gordinha brinca na sala com o papai, que a abraça e repete "te amo minha filha". A criança não está à vontade, mas lança "te amo papai" enquanto olha pro chão. Aí entra a boa esposa, sorrindo, e dizendo como a família deles é feliz. Aí, sai a criança de cena. A esposa diz:"Adriano, tudo na nossa vida é perfeito, você só precisa parar de falar com aquela mulher". Adriano, acuado, diz que vai terminar tudo com a amante. A esposa o abraça e diz "eu te amo". Adriano encontra Norma, a macumbeira e amante no bar. Tomam uma coca-cola. Norma pede um beijinho. Adriano diz que não dá mais. Grita "Eu amo minha esposa!". Norma, inconformada "você não pode me usar e me jogar fora assim! Vou acabar com tua vida". Adriano sai da mesa. Close no rosto de Norma, que entorta as sobrancelhas até sua cara se deformar, em uma feição satânica:" Adriano, você me paga. Isso não vai ficar assim". Adriano chega em casa. Sua boa esposa está caída no sofá, enrolada em um lençol branco, com a mesma roupa que usava no começo do episódio. "Me ajuda Adriano, eu estou mal". A criança grita "mamãe!". Adriano chama a ambulância. A boa esposa pegou uma mandinga forte. Os médicos estão desacreditados. Adriano põe as mãos na cabeça, desesperado "Ai meu Deus, e agora?O que está acontecendo? Ela sempre foi saudável e de repente fica doente? Meu Deeeeeeeeus". Fim.

Pastores entram em cena e discutem o poder dos feitiços, das mulheres raivosas e dos esposos que comem fora de casa. Convocam as "minhas senhoras" de todo Brasil pra tomarem uma "reza forte" e se banharem com as águas do Rio Jordão, que milagrosamente estarão disponíveis nesta segunda feira na Sessão do Descarrego.

Episódio 2: A Cueca do destino

Outro casal super-feliz está tomando café da manhã:
“Ai Eduardo, a gente é tão feliz né? Todo mundo comenta como nosso casamento é perfeito. A gente não briga nunca, tudo é tão bom, tão certo” E Eduardo diz, ao passar manteiga no pão “É sim meu amor, eu te amo”. “Então a Norma perdeu o namorado semana passada. Também, só se envolve com homem casado” diz a esposa, comendo uma bolacha maisena. Eduardo é complacente “Ela só não encontrou a pessoa certa, assim como eu encontrei você. Eu te amo”. “Eu também te amo meu amor!” declara a boa esposa, ao dar uma golada no suco. A campainha toca. “É a Norma! Ela veio me ajudar a fazer faxina!” diz a esposa, que corre para abrir a porta. Norma, a mulher das mandinga, entra com olhar de inveja: “Olha só, como vai o casal mais feliz e perfeito do mundo?” . O casal responde sorrindo “que está tudo ótimo!”. Eduardo sai para trabalhar, dá um beijo na esposa e repete, pela nonagésima vez “Eu te amo”. A esposa chama Norma, a macumbeira, para ajudar a limpar o quarto. No quarto, existem várias prateleiras com bichinhos de pelúcia, um Snoopy e um boneco do Buzz-Lightyear. Uma decoração estranha, seria o quarto de uma criança adaptado para o episódio? Mas a decoração não vem ao caso. O caso vem agora: Norma vai arrumar a cama e diz “Nossa que bagunça”. A boa esposa diz “Eduardo é bagunceiro mesmo, mas é um ótimo marido, eu amo ele demais.” Norma sorri com cara de cooo.
A boa esposa sai. Norma fuça nas coisas em cima da cama. Encontra a cueca de Eduardo. Dá uma cheirada. Fecha os olhos. Continua cheirando. Depois abre os olhos “Eduardo, você vai ser meu. Vou acabar com a alegria dessa casa”, e cheira a cuequinha mais uma vez. Mais tarde, Eduardo está deitado na cama com a esposa. Ela faz carinho nele. Eduardo surta “Tire as mãos de mim! Eu não quero que você encoste em mim!”. A esposa, assustada e carente chora: “O que está acontecendo? Você está estranho, tem me evitado, o que foi?”. “Eu tenho nojo de você, as sua voz, do seu cheiro, de tudo! Eu não agüento mais!”, grita Eduardo enquanto sai do quarto. A esposa coloca as mãos na cabeça, desesperada “Ai meu Deus, o que está acontecendo? Porque ele ficou assim comigo? Meu Deuuuuuuuus!”. Fim.


Norma, a macumbeira, cheirando cueca.

Os pastores aparecem novamente, discutem que o diabo age na vida das pessoas, por inveja. “Pois é pastor Hamilton, o encosto entra na vida da pessoa, e de uma hora pra outra tudo começa a dar errado. O marido muda com a esposa de repente, não agüenta mais ficar perto dela.” Por isso minha senhora, você que está desesperada, com um filho viciado, uma filha rebelde e prostituída, um marido que fugiu com a amante macumbeira cheiradora de cuecas, venha tirar o mal de você, venha para a sessão do descarrego com as água do Rio Jordão.