Quando passei um tempo da Europa devo admitir, senti falta da comida brasileira. Da fartura e da qualidade dos ingredientes (eu estive no velho continente durante o inverno, e não há abundância de ingredientes frescos nessa época). Eu gastei uma fortuna para conseguir comer uma banana. Precisava de uma fruta, de um belo bife, de um suco de laranja que não fosse pasteurizado.
Adoro coxinha, torresmo, feijoada. Sou junkie, não sempre, mas convenhamos, uma bela empada de palmito enriquece a alma. Sou daquelas que adora uma montanha de salada porém não dispensa um Eisbein bem feito. Sou amante dos suínos e seus derivados. Por outro lado, adoro comer rabanetes enquanto assisto TV. Não tente me entender, meu paladar é como meu gosto musical - Eu ouço desde Bauhaus a Glória Estefan sem nenhum pudor.
Voltando ao meu estômago. Eu realmente gostaria de comer uma porção de Eisben frito e depois cuspí-la na cara do Ministro da Saúde do Brasil, o Sr. José Gomes Temporão. Só para ouvir seu grito de pavor.
O Ministro Temporão é um homem natural. Ao contrário de mim, creio que ele come apenas alface e brotos de feijão. Eu não me importo com a alimentação deste homem, mas saiba que como Ministro, ele se importa com a sua e com a minha. Tanto se importa que quer entrar na sua casa, na sua despensa e porquê não, no seu estômago, e tirar tudo o que houver de gordura trans da sua vida. O Temporão impôs uma lei para que todas as indústrias de alimento brasileiras parem de fabricar alimentos com gordura trans para sempre. Mesmo que eu, euzinha aqui, saiba que a tal gordura não faz bem pra mim, faço questão de comê-la. É um problema meu. Na visão de temporão, é um problema dele.
Não preciso do Sr. Temporão para me ensinar a comer. Minha mãe me ensinou certinho, obrigada. Ela cozinha muito bem, desde deliciosas costelinhas de porco ao vinho até uma saudável salada de berinjelas. Minha família tem um paladar forte. Meu bisavô, que morreu aos 98 anos de velhice, fazia linguiças curadas caseiras - e as comia cruas, cortando com uma faca, acompanhada de um pedaço de pão e um copo de vinho. Pão esse, feito como se fazia antigamente: com banha de porco. Minha bisavó, que era gordinha, adorava frituras. Bolinhos, legumes, tudo ela empanava. Morreu também beirando os 100 anos, feliz que só. Gordura Trans corre no sangue de minha árvore genealógica, corre feliz e todos nós sorrimos ao ver uma mesa farta e saborosa.
Não condeno quem prefere uma vida totalmente saudável. Cada um se satisfaz como quer. O que eu como é problema meu. Seria problema de alguém se eu fosse canibal. Mas não sou. Comer gordura trans, que eu saiba, não é crime. Mas o Sr. Temporão diz que as indústrias (as esses capitalistas assassinos) querem matar os brasileiros de enfarte. Para o Sr. Temporão, aquele homem que aparece na propaganda da Bauducco, montando uma assadeira de biscoitos ou um panetone fofinho, na verdade é o anti-Cristo enfiando grodura trans no seu coração até que ele exploda.
Veja bem, sou a favor da liberdade. Se uma fábrica de biscoitos quer eliminar toda gordura trans de seus produtos e anunciar isso aos quatro ventos, ótimo. As pessoas que se importam com com a gordura mortal vão consumir o produto livre de tal gordura. Agora forçar todo mundo a seguir uma dieta especial porque o Sr. Temporão acha que eu sou uma criança babona que mal sabe segurar o garfo, faça me o favor.
Esse aqui é o país da feijoada, do acarajé, da coxa creme, do virado paulista e da buchada. O Sr. Temporão pretende fazer o quê? Colar adesivos nas portas de restaurantes, padarias, lanchonetes, botecos e vendedores ambulantes de todo Brasil com os dizeres "gordura pode causar parada cardíaca" acompanhado de uma foto de um obeso mórbido? Imagine um vendedor de churro usando um avental estampado com veias entupidas. Hmm, delícia.
Brasil meus amores, Brasil.
PS: Esse texto não se trata de comida em si, ou gordura trans. Ele critica na verdade o controle cada vez mais "paternal"do governo atual, que cria leis para que nós, pobres cidadãos imbecis, entendam que alguém maior e mais "inteligente" cuida de nossa vida nos aspectos mais inúteis. Porque se dependesse da gente, na visão deles, estaríamos vivendo em árvores e arremessando fezes uns nos outros. O que acontece aqui é a destruição total e completa da individualidade, do livre arbítrio. Algo que Brasil tem destruído um pouco a cada dia. Enquanto isso, bebês estão morrendo no Pará - algo que o Ministro da Saúde ainda não resolveu consertar.
9 de set. de 2008
Excesso de gordura mental
Escrito por Sarah às 17:56
Labels: Brasil, Comida, Revolta pessoal